Quem já ouviu a história do Barba Azul? Quem já ouviu a história da Branca de Neve? E Chapeuzinho vermelho? João e Maria?
O Barba Azul, para quem não lembra, matava todas as esposas, porque ele as julgava indigna e desobediente, até que a última descobre seu segredo e com astucia e um pouco de sorte se livra do tirano. Branca de Neve sofre na mão da madrasta que mata seu amado pai, em algumas versões provocou a morte da sua mãe também. Preciso falar de Chapeuzinho vermelho? Do plano maléfico do lobo de jantar a vovozinha como entrada e a menina como prato principal? João e Maria, pais que abandonaram os filhos ao relento, ao destino, que precisam enfrentar uma bruxa canibal. Eu poderia também falar das histórias bíblicas, de Daniel na Cova dos Leões, de José do Egito, traído pelos seus irmãos, poderiam falar de Ló e suas filhas, histórias que li em livros de histórias bíblicas para crianças, mas não vou entrar neste mérito… Você que ouviu uma destas histórias na infância, senão todas, acredita que elas influenciaram negativamente na sua formção? Conhece alguém que se tornou um Serial Killer por ouvi a história do Barba Azul?
Por que essas histórias com dramas, enredos tão fortes encantam crianças de geração a geração? Essas histórias representam algum perigo para nossas crianças? Essas talvez sejam perguntas de pais e educadores. E quem responde é o psicólogo e pesquisador Bruno Bettelheim, no livro a Psicanálise dos Contos de Fadas, que em 1948 já temia pela perseguição aos contos de fadas. Ele explica que tais contos falam em uma linguagem simbólica, a mesma linguagem dos sonhos, é um mundo fantástico, e podemos ter certeza que a criança tem plena consciência disso. A criança é a melhor entendedora desse universo fantástico do que você, mãe, professor, educador. Quando a criança escuta um conto ela relaciona o vilão da história com aquilo que a faz mal, que pode ser ou não ser uma pessoa. O vilão pode ser aquela alergia alimentar que tanto a agride, a priva de comer suas guloseimas favoritos, pode ser a diabetes tipo 1, pode ser babá que lhe maltrata quando seu pais não estão em casa, a cuidadora da creche, um professor, um coleguinha, cada criança tem seu próprio vilão, as vezes reais, as vezes imaginários.
A criança entende e se relaciona com mais facilidade com a linguagem simbólica, ela entende o mundo do “era uma vez” que não é o mundo dos telejornais, por exemplo, vejo às vezes os pais com a televisão ligada em noticiários sensacionalistas que mostram todas as mazelas sociais, crimes bárbaros, a criança sabe que aquilo é real, que não é o mesmo enredo das histórias fabulosos, nem a mesma linguagem. Esse tipo de exposição é a que gera traumas aos nossos pequenos, que deixam eles agitados, sem sono… Os contos tradicionais, ao contrario os acalma, os ensina a lidar com os medos, angustias e tristezas, a lidar muitas vezes com uma realidade cruel, a denunciar seus vilões.
Não posso deixar de citar ”A triste História de Eredegalda” recontada com muita beleza por José Mauro Brant, no livro “Enquanto o sono não vem”. A ela se aplicam as considerações já feitas. O pai, o vilão da história pode ser qualquer coisa que afeta a criança, inclusive um pai, um padrasto, um tio, um abusador. Lembre-se que uma criança vitima de violência sexual se sente, suja, indigna, saber que até as princesas podem passar por esse tipo de situação dar força para criança enfrentar o problema, para denunciar.
Na guerra entre o bem e o mal, não vamos errar o alvo, as histórias fantásticas, os contos tradicionais, os contos de fadas, as lendas, os mitos, as fabulas, as parábolas, a literatura, não são os vilões, são os heróis…
Para os queridos colegas professores, educadores e os pais, todos unidos pela preocupação em educar bem nossos pequenos indico a leitura do livro “A psicanálise dos Contos de Fadas” de Bruno Bettelheim. E para finalizar completamos o título deste texto, o perigo dos contos de Fadas é deixa-los de narrar, evite o perigo, conte uma história.
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